quarta-feira, 22 de outubro de 2008

EMBALAGENS E A "MELHOR IDADE"


Queridos oito leitores do blog:

Aqui está o texto que havia prometido do publicitário londrinense Júlio Bahr.

Bem humorado e atual, o texto é sensacional.

Os blogs de Bahr estão ao lado direito da página. Apareçam por lá.

Valeu Júlio!


Embalagens e a “Melhor Idade”

Julio Ernesto Bahr


Será que os meus colegas publicitários pensam nas pessoas da Terceira Idade quando elaboram rótulos e embalagens? Terceira Idade, aliás, que algumas almas generosas preferem designar como a da “Melhor Idade”.

Melhor idade para o quê? Para ler, certamente que não!

Pois é geralmente na “Segunda Idade” que os óculos para leitura começam a fazer parte do nosso “uniforme” obrigatório. Daí para diante, a visão só tende a piorar.

Na Terceira Idade a seleção dos alimentos permitidos pelos médicos se torna cada vez mais restrita. Controles da glicose e do colesterol impõem novas regras. Isso quando os triglicerídios e o ácido úrico ainda não chegaram a níveis críticos.

Aliás, sua uréia e creatinina, como estão?

Açúcar, não pode. Alto índice de calorias, não pode. Gordura vegetal, não pode. Sal é perigoso. Gordura animal é veneno. Cuidado com alimentos que contenham ovos.

Você aí, que é jovem, não tem restrições alimentares e possui a visão aguçada da águia, já parou alguma vez em um supermercado para examinar as embalagens dos produtos? Consegue ler tudo o que está escrito?

Parece que boa parte das embalagens foi feita para dificultar nossa leitura e a identificação do conteúdo.

Simples torradas, por exemplo. Só mesmo usando uma potente lupa para descobrir que aqueles fios pretos na parte posterior da embalagem, que você julgava ser apenas um grafismo criado pelo diretor de arte, na verdade são linhas de texto descritivas dos ingredientes. Provavelmente em corpo 2 ou 3, para caber em português e espanhol. E quando você consegue o supremo milagre de ler o que está escrito, mata a charada: nenhum fabricante de alimentos faz questão de alardear que, junto com a torrada, estamos ingerindo emulsificante diacetil tartarato de mono e diglicerídios, alfa amilase e estabilizante. O que quer que isto signifique.

Deixei de comprar uma geléia aparentemente saborosa, cujo rótulo, impresso com as cores fora de registro, continha letras douradas sobre um fundo lilás... em corpo 3. Ou seja, o rótulo foi mesmo planejado para não ser lido.

Muitos produtos embalados em vidros apresentam informações na lateral da tampinha metálica. Como geralmente são textos longos, eles mais parecem cocozinhos de mosca atuando como mero adorno gráfico.

De tudo isso, podemos tirar algumas conclusões:

1 – Alguns fabricantes de produtos alimentícios não fazem questão que os consumidores leiam o que está escrito nas embalagens.

2 – Pessoas da Terceira Idade nunca devem fazer compras sozinhas em supermercados

3 – Os publicitários acreditam que jamais ficarão idosos – ou que sua visão será eternamente perfeita

4 – A legislação obriga os fabricantes a imprimir rótulos e embalagens legíveis. Mas, falta maior fiscalização, além de denúncias, por parte do consumidor lesado.

Em países ditos do Primeiro Mundo, a população é muito mais exigente, luta ostensivamente pelos seus direitos e freqüentemente boicota produtos que não atendam às suas exigências.

E nós aqui, no Brasil? Até quando nossos olhos vão ser enganados pelos micro-textos de embalagens, lendo “emocionante”, no lugar de emulsificante, “policiais” em vez de polióis, “ácido crítico” onde está ácido cítrico e “gordura legal” em vez de gordura total?

Um comentário:

Julio Ernesto Bahr disse...

Caríssimo André:
Fico grato com a publicação desse artigo. Creio que é um serviço de utilidade pública para ajudar a forçar os fabricantes de alimentos a imprimirem textos legíveis nas suas embalagens, como hoje em dia devem fazer os laboratórios que imprimem bulas nos medicamentos.
Aproveito para fazer uma retificação: não sou acadêmico, apenas tenho freqüentado a Academia de Letras, Artes e Ciências de Londrina, apreciando sobremaneira os temas apresentados e ousando, vez por outra, ler alguns dos artigos ou crônicas que escrevo.
Um grande abraço,
Julio Bahr