Em um lago, sinais da lenta mudança da savana para o Saara
Kenneth Chang
Seis mil anos atrás, o norte da África era um lugar de árvores, pastagens, lagos e gente. Hoje é o Saara -uma área deserta maior que a Austrália. O lago Yoa, no nordeste do Chade, permaneceu um lago durante milênios e ainda é um lago, rodeado pelo deserto quente. Embora haja pouca chuva, a água do lago Yoa é reabastecida por um aqüífero subterrâneo.
Analisando as milhares de camadas de sedimentos de um núcleo, que é uma coluna de sedimentos perfurada do fundo do lago, uma equipe de cientistas reconstruiu o clima da região conforme a savana se transformou em Saara.
Na edição de sexta-feira da revista "Science", os pesquisadores liderados por Stefan Kroepelin, um geólogo do Instituto de Arqueologia Pré-histórica da Universidade de Colônia na Alemanha, relata que a transição climática ocorreu gradualmente.
Particularmente, a mudança nos tipos de pólen que caíam na água e afundavam conta a história de como o terreno mudou de árvores para arbustos para gramíneas e areia -"onde hoje você não encontra um único pedaço de grama", disse Kroepelin.
As conclusões vão contra uma visão prevalecente de que a mudança ocorreu abruptamente, em poucos séculos, há cerca de 5.500 anos, marcando o fim do "período úmido africano", quando as chuvas de monções inundavam a região.
Essa visão surge de núcleos de sedimento oceânico retirado ao largo da costa oeste da Mauritânia. Em 2000, análises dos núcleos de pesquisadores liderados por Peter B. deMenocal, do Observatório da Terra Lamont-Doherty da Universidade de Columbia, mostraram um súbito aumento da poeira soprada da África naquela época.
Kroepelin não discutiu os dados do núcleo oceânico, mas disse que haviam sido "interpretados exageradamente".
Os dados sobre o que acontecia na terra são esparsos, porque as areias sopradas pelo vento não preservam um registro geológico claro como os sedimentos nos lagos. Mas no lago Yoa a água que enchia os aqüíferos subterrâneos no período úmido, que começou 14.800 anos atrás, continuou fluindo para o lago de 18 metros de profundidade. É o suficiente para compensar os 6 metros de água que evaporam do lago todos os anos, disse Kroepelin. Apenas alguns milímetros de chuva caem por ano.
Kroepelin disse que espera voltar ao lago Yoa no ano que vem para perfurar um núcleo que poderá rastrear a história climática há 12 mil anos.
DeMenocal elogiou a pesquisa de Kroepelin. "Acho que é um corpo de trabalho muito bom", ele disse. "Realmente é a única coisa desse tipo do interior árido." Mas ele disse que o pólen poderia ter vindo principalmente da área imediatamente ao redor do lago e não do Saara em geral.
Jonathan A. Holmes, diretor do Centro de Pesquisa de Mudança Ambiental no University College em Londres, disse que os dois conjuntos de pesquisas foram realizados cuidadosamente e que o desafio seria montar uma história mais complexa do clima da região.
"Eu não acho que qualquer dos registros esteja errado", disse Holmes, que escreveu um comentário que acompanha o artigo na "Science". "Acho que eles representam coisas ligeiramente diferentes."
Holmes disse que uma possibilidade é que a poeira no litoral reflita uma diminuição no nível de água ao redor do lago Chade, revelando um solo que produz mais poeira.
Por mais rápida que tenha ocorrido a seca, ela empurrou a população para fora do centro-norte da África, disse DeMenocal, e essa migração forçada pelo clima poderia ter levado à ascensão dos faraós e da civilização egípcia.
Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves
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