Pacto anti-Protógenes
Foram movimentos sincronizados:
1) Depois de afastar o delegado Protógenes Queiroz da Operação Satiagraha, primeiro, e de seu posto de elite na Polícia Federal, depois, agora o governo o tira da própria PF, como já tinha despachado o delegado Paulo Lacerda da Abin para um posto honorário em Lisboa;
2) Ao mesmo tempo, os presidentes da República, do Supremo Tribunal Federal, do Senado e da Câmara assinam um "Pacto Republicano" para, de um lado, agilizar a Justiça, e, de outro, maneirar a sanha da polícia.
Somados, o afastamento de Protógenes, que tende a ser definitivo, e o Pacto, que foi apenas um gesto político e não teve impacto nenhum, significam que os três Poderes se uniram para dar um chega-pra-lá no crescendo da PF na quebra de sigilos telefônicos, na invasão da privacidade, no excesso de poder.
Os dois movimentos significam, também, que o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo, venceu essa parada: a parada para mostrar que a PF estava fora de controle e que, além de suspeitos, começou a investigar todo mundo indiscriminadamente, até o próprio Supremo e o próprio Planalto.
O tal pacto, portanto, tem as boas intenções de preservar a democracia, a ordem institucional, os direitos individuais, valores mais do que reconhecidos. Mas... de boas intenções o inferno está cheio.
Um dos senões do pacto é que ele foi assinado solenemente, depois de longos discursos, por Lula, Gilmar, Sarney e Temer, lá pela hora do almoço na segunda-feira. E até hoje, quarta, ninguém sabe, ninguém viu os textos dos cinco projetos que transformam, ou transformariam, o palavrório e as assinaturas em algo mais ou menos concreto. A Casa Civil não liberou os textos.
De duas, uma. Ou Lula assinou os projetos sem que a Casa Civil tivesse passado o pente fino antes, ou a Casa Civil recuou e agora não está mais avalizando o que avalizara para o presidente assinar. O que, em qualquer caso, não tem nada de republicano, nem de desvelo administrativo.
Outro senão ao pacto sem impacto é a intenção de agilizar a votação de projetos de regulamentação da escuta telefônica, da prisão preventiva, do uso de algemas e abuso de autoridade --o que pode ser chamado de "pacto anti-Protógenes". Só que essas votações dependem do Congresso.
E o Congresso está mais sujo do que pau de galinheiro, às voltas com pagamentos de jatinhos para quem já tem jato, telefone celular com contas de R$ 14 mil para filho de parlamentar dividir com os amigos no exterior, empregadas domésticas custeadas pelo Estado, pagamento de horas extras em pleno recesso, 130, 180, sei lá quantos diretores só no Senado.
Por último, o senão que não quer calar: ok, a PF estava fora de controle, um poder sobre todos os Poderes, mas até que ponto seu raio de ação e sua capacidade de operação serão coibidos? Tudo na vida é uma questão de bom senso, de equilíbrio. Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar.
O novo diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, que age discretamente, vem sendo bastante elogiado por ter comando, ser afirmativo e estar botando a casa em ordem. Mas que a PF não saia das "ações espetaculosas", como acusava Gilmar Mendes, para a pura e simples passividade diante dos crimes de colarinho branco. Ou seja, que não extrapole seus deveres, mas que tenha poder suficiente para continuar sendo temida pelos poderosos.
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.
E-mail: elianec@uol.com.br
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Foram movimentos sincronizados:
1) Depois de afastar o delegado Protógenes Queiroz da Operação Satiagraha, primeiro, e de seu posto de elite na Polícia Federal, depois, agora o governo o tira da própria PF, como já tinha despachado o delegado Paulo Lacerda da Abin para um posto honorário em Lisboa;
2) Ao mesmo tempo, os presidentes da República, do Supremo Tribunal Federal, do Senado e da Câmara assinam um "Pacto Republicano" para, de um lado, agilizar a Justiça, e, de outro, maneirar a sanha da polícia.
Somados, o afastamento de Protógenes, que tende a ser definitivo, e o Pacto, que foi apenas um gesto político e não teve impacto nenhum, significam que os três Poderes se uniram para dar um chega-pra-lá no crescendo da PF na quebra de sigilos telefônicos, na invasão da privacidade, no excesso de poder.
Os dois movimentos significam, também, que o ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo, venceu essa parada: a parada para mostrar que a PF estava fora de controle e que, além de suspeitos, começou a investigar todo mundo indiscriminadamente, até o próprio Supremo e o próprio Planalto.
O tal pacto, portanto, tem as boas intenções de preservar a democracia, a ordem institucional, os direitos individuais, valores mais do que reconhecidos. Mas... de boas intenções o inferno está cheio.
Um dos senões do pacto é que ele foi assinado solenemente, depois de longos discursos, por Lula, Gilmar, Sarney e Temer, lá pela hora do almoço na segunda-feira. E até hoje, quarta, ninguém sabe, ninguém viu os textos dos cinco projetos que transformam, ou transformariam, o palavrório e as assinaturas em algo mais ou menos concreto. A Casa Civil não liberou os textos.
De duas, uma. Ou Lula assinou os projetos sem que a Casa Civil tivesse passado o pente fino antes, ou a Casa Civil recuou e agora não está mais avalizando o que avalizara para o presidente assinar. O que, em qualquer caso, não tem nada de republicano, nem de desvelo administrativo.
Outro senão ao pacto sem impacto é a intenção de agilizar a votação de projetos de regulamentação da escuta telefônica, da prisão preventiva, do uso de algemas e abuso de autoridade --o que pode ser chamado de "pacto anti-Protógenes". Só que essas votações dependem do Congresso.
E o Congresso está mais sujo do que pau de galinheiro, às voltas com pagamentos de jatinhos para quem já tem jato, telefone celular com contas de R$ 14 mil para filho de parlamentar dividir com os amigos no exterior, empregadas domésticas custeadas pelo Estado, pagamento de horas extras em pleno recesso, 130, 180, sei lá quantos diretores só no Senado.
Por último, o senão que não quer calar: ok, a PF estava fora de controle, um poder sobre todos os Poderes, mas até que ponto seu raio de ação e sua capacidade de operação serão coibidos? Tudo na vida é uma questão de bom senso, de equilíbrio. Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar.
O novo diretor-geral, Luiz Fernando Corrêa, que age discretamente, vem sendo bastante elogiado por ter comando, ser afirmativo e estar botando a casa em ordem. Mas que a PF não saia das "ações espetaculosas", como acusava Gilmar Mendes, para a pura e simples passividade diante dos crimes de colarinho branco. Ou seja, que não extrapole seus deveres, mas que tenha poder suficiente para continuar sendo temida pelos poderosos.
Eliane Cantanhêde é colunista da Folha, desde 1997, e comenta governos, política interna e externa, defesa, área social e comportamento. Foi colunista do Jornal do Brasil e do Estado de S. Paulo, além de diretora de redação das sucursais de O Globo, Gazeta Mercantil e da própria Folha em Brasília.
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